Photo-review: Análise da foto, com o biker Robson Ferreira

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Este é o primeiro photo-review que escrevo nessa nova fase do site. O objetivo será trazer periodicamente uma foto para análise, tanto pela técnica quanto pela composição. Para iniciar teremos uma imagem "antiga", mas bastante relevante.

Ela foi feita em maio de 2012 em uma etapa da Wol Extreme, uma série de duras provas nas trilhas de Saquarema/RJ. Cobri os eventos como fotógrafo oficial, tendo acesso a pontos perfeitos do circuito, no meio da mata. Uma das preocupações era fazer um bom registro do Robson Ferreira, estrela do ciclismo nacional, tri-campeão brasileiro da modalidade "Marathon". Fiquei muito feliz ao capturar esta cena, mostrando a concentração do campeão rumo à vitória. Mas antes de começar, vamos ver por que ela está aqui!

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Porque essa foto?

Meu trabalho desde 2009 junto à FECIERJ - Federação de Ciclismo do RJ - envolve a cobertura fotográfica dos grandes eventos ciclísticos que acontecem no Rio de Janeiro. A instituição cuida da organização destes eventos, procurando sempre homenager um atleta "da terra" nos materiais publicitários.

Desta vez o escolhido foi o Robson Ferreira, que reside em Mendes, cidade serrana do oeste do RJ. Ele é um grande e carismático ídolo do esporte. Dono de determinação e disciplina exemplares, "o cara" consegue conciliar a vida de pai de família, os estudos de farmacologia (formou-se recentemente) e os treinos no esporte de alto rendimento. E ainda mantém um enorme sorriso no rosto, um dos seus traços mais carismáticos.

Esta foto foi escolhida para ilustrar todo o material da Taça Brasil de Mountain Bike 2016 (Maricá/RJ, em 27/11), uma das mais importantes provas do Brasil. Apesar de feita em 2012, a sua estética foi a chave para a escolha, numa justa homenagem ao campeão. E é por isso que ela também está aqui, inaugurando nossos reviews!

A técnica

Neste dia, com o auxílio da organização do evento que disponibilizou um 4x4 para meu transporte, consegui ir a partes distantes do percurso em busca de uma boa luz e dos trechos mais técnicos do trajeto, que sempre rendem grandes cenas. Usei o recurso do panning, que consiste em deixar o fundo borrado mas mantendo o objeto principal nítido, aumentando a sensação de velocidade e movimento, sabendo que o efeito agrada bastante. Confesso que a "pressão" por fotografar o Robson me levou à esta decisão, pois sempre funciona.

Para que o panning fique bom é preciso "simular" duas exposições numa mesma foto. O fundo precisa ser registrado a uma velocidade de obturação lenta, enquanto o primeiro plano precisa ser congelado. Não é fácil, pois tudo depende de um correto "timing" entre o disparo e o movimento do modelo. O truque principal é manter a câmera em constante movimento junto ao modelo, mantendo-o mesmo após o disparo. Assim ganhamos o efeito de velocidade. Um flash ajuda bastante congelar o primeiro plano. A parte difícil é conciliar isso com a fotometria.

A fotometria

Aí a coisa complica um pouco. No panning, como é preciso duas exposições em uma, a fotometria exata se torna essencial. Neste tipo de foto minha abordagem é medir as luzes do fundo (principalmente copa das arvores) para definir a abertura, mantendo um ISO mais sensivel que permita a captação de áreas escuras de sombras do solo.

O flash nunca fica muito forte, raramente ultrapassando 1/16 de potência, para que eu possa trabalhar em suas velocidades mais altas de emissão de luz. Nunca uso o flash em TTL, pois perco o controle criativo. Além disso, o atraso de microsegundos do TTL e seus cálculos me faria perder as fotos, e isso é inadmissível. Neste esporte tudo é muito rápido: bobeou, dançou. E muitas vezes só há uma única chance de registrar um atleta.

A velocidade de obturação depende da luz ambiente, da aceleração do atleta e do "timing" no movimento da câmera. Este detalhe é o que define o tamanho dos borrões no fundo, junto à nitidez das bordas do primeiro plano. Nesta foto, os ajustes foram:

f/5, 1/60s, ISO 400



A lente

O espaço para fotografar dentro de trilhas sempre é muito restrito, e muitas vezes me encontro em posições perigosas, muito perto dos ciclistas em alta velocidade. Por isso, nestes casos, prefiro grande-angulares como a Sigma 10-20 4.5/5.6 EX DC que usei nesta foto. Ela é uma grande parceira no meu trabalho. Seu pequeno tamanho e grande qualidade ótica são suficientes para substituir a minha Nikkor 14-24 2.8 (uma lente lendária, mas pesada, volumosa e muito cara!) em alguns trabalhos! A Nikkor "toda-poderosa" é realmente um monstro de qualidade, MAS tem que dar o braço a torcer quando o assunto é praticidade e custo-benefício. E mais: com o risco de colisões sempre presente nestes trabalhos, prefiro deixá-la para trampos mais tranquilos. Um desastre desse nunca aconteceu comigo, mas sabe-se lá...

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O problema é a distorção que a 10-20 gera nos vértices da imagem, mas isso é até normal em lentes da sua categoria, as Grande-angulares Retilineares. Ao contrário das Grande-angulares Diagonais (Fish-Eye), as retilineares não arredondam a imagem, mas por outro lado "esticam" os vértices e criam efeitos que podem não ser adequados. Note as distorções entre a cabeça do Robson, suas pernas e a roda dianteira da bike! Porém, nesse tipo de imagem, este problema não chega a ser um grande defeito. Dá pra viver com ele.

Outro detalhe: Esta Sigma é do tipo DC, ou seja, foi feita para sensores APS. As Sigma para full-frame são as DG. Quando uso a 10-20 com minhas full-frame tenho que configurá-las para o quadro cropado e resolução menor, mesmo em RAW. Mas também dá para viver com isso. A propósito, essa é a única "lente APS" que mantive em meu set após a migração para FF, alguns anos atrás. E a mantive justamente pela sua praticidade! É um bom produto da Sigma, sem dúvida.

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A composição

Sempre procuro dar aos meus "modelos-atletas" a devida importância na imagem. Aqui eu preferi por um contra-mergulho (ou seja, "visão de baixo para cima"), em 45 graus. A concentração no rosto do Robson é um truque à parte: sei que os atletas sempre estão assim, focados, quando passam por terrenos difíceis. E a postura corporal também fica muito mais bonita. Este é um dos grandes segredos da fotografia esportiva: conhecer a fundo a dinâmica do esporte e o comportamento dos atletas para conseguir captar as melhores cenas.

O croqui ao lado destaca os principais elementos usados nesta composição. A verticalização da cena foi proposital, com uma grande linha de força vertical (seta branca) baseada em um triângulo (amarelo) que aponta para o rosto no canto superior esquerdo, uma área sempre importante na composição fotográfica. O movimento circular da câmera durante o panning garantiu o aspecto arredondado das luzes de fundo, reforçando o sentido do movimento e o dinamismo (seta vermelha). E ainda ajuda a guiar os olhos do observador sobre a imagem!

Conclusão

É assim que a coisa funciona! Costumo dizer em meus cursos que a boa fotografia não é um chute, ela é calculada e pensada antes do clic. O fotógrafo deve ser capaz de repetir um efeito sempre que desejar, de maneira consciente e precisa. E não há como ser de outra forma, pois precisamos honrar a importância e grandeza dos nossos "modelos" e entregar o máximo de qualidade ao cliente. Sei que o Robson curtiu esta imagem, e é uma sincera forma que tenho de enaltecer os exemplos que estes heróis do esporte nos trazem.

Termino aqui nosso primeiro Photo-review! Espero que tenha sido útil, amigos! Comente abaixo o que achou!

Paz e boas fotos!

Hudson Malta

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Em outra prova, na poeira de Campos/RJ, Robson Ferreira (numeral 001) briga com demais atletas


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O simpático campeão e sua simplicidade sempre marcante.




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